domingo, 31 de janeiro de 2010

75 – A Dama do Metrô



E unidos na quentura dos corpos, as mãos sincronizadas em movimentos, não rápidas, porém exuberantes de ansiedade, subiam e desciam ao mesmo tempo em que tiravam a roupa, peça por peça, sendo jogadas despreocupadamente ao chão.
O hálito quente de cada um picava os pescoços numa respiração ofegante e descompassada proferindo desconexas palavras.
As mãos descrevendo retas e convexos círculos desafiavam a natureza física que dizia: dois corpos não ocupam o mesmo lugar.
A televisão continuava com seu murmúrio quando passaram por ela em direção ao quarto.
- Então, Malu, aceita a minha proposta.
- Vou pensar.
Estavam na cozinha tomando café depois de uma noite intensa de amor e prazeres. Com sua carne de vinte anos, saudável sentindo na pele nua a friagem da manhã e dos objetos, Malu sorria para o amante tendo em mente suas próximas ações.
- Não vai me responder - perguntou mordendo um pedaço de pão.
- Vou responder sim, mas da maneira que eu conheço.
Levantou-se e achegando-se ao amante, empurrou a mesa com violência e sentou-se em seu colo, beijando seu rosto, seu pescoço, o peito, ao mesmo tempo em que mordia o pedaço de pão que ele comia. Entre pão, manteiga, suco, requeijão, dois corpos rolavam no chão da cozinha enquanto a manhã respondia com um belo sol estampando ao mundo a alegria.
Tempos depois, Malu entrava numa sala preparada para ela, onde se lia na porta.
Malu – Gerente de Markting.
Malu clicou em imprimir. Foi até a cozinha e se serviu de uma dose bem generosa de uísque. Assim que a impressora encerrou seu trabalho, pegou o calhamaço de folhas, enfiou num envelope grande, e escreveu.
Para o meu Editor – Malu
Lacrou o envelope e colocou em cima da mesa. Depois foi até o quarto, se despiu, e nua se postou em frente a janela da sala, e ficou por um longo tempo olhando para o vazio da vida.
No dia seguinte os jornais estampavam a noticia.

“A famosa escritora Malu suicidou-se. Seu corpo foi encontrado perto do prédio onde morava no décimo segundo andar. Nua, abraçada a um pênis gigante de borracha Malu se suicidou aos sessenta anos de idade. Famosa por seus contos eróticos onde contava histórias envolvendo suas aventuras no Metrô, teve sua vida vasculhada quando se envolveu aos cinqüenta e dois anos, no escândalo em que foi acusada de aliciar menores em seu apartamento. Ao sair com a fama chamuscada, se recolheu onde ninguém mais tinha noticia dela. Corria o boato que ela estava escrevendo suas memórias. A policia encontrou em seu apartamento um envelope com o manuscrito do seu livro, onde no final deixou uma citação da escritora Hilda Hilst: Ainda que as janelas se fecham, é certo que amanhece. Seu enterro será amanhã às catorze horas no cemitério da Vila Formosa”.

FIM

05.07.07
pastorelli

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

74 – A Dama do Metrô




A tigela de pipoca corria o perigo de cair do seu colo e se espatifar no assoalho lustroso, enquanto que, o som da televisão invadia o apartamento se confundindo num dialogo de vozes que se perdiam na tarde de domingo. O sol invadia a pequena sala pouco se importando até onde alcançaria seu raio. Malu deslizava entre um objeto e outro, procurava não pisar nas filigranas de luz. Cuidadosamente conduzia o pé devagar calculando a distância entre uma passada e outra. Não atinava porque tinha que andar dessa maneira, com cuidado, devagar e não pisar nas finas listas de luz. E, também não sabia o que aconteceria caso pisasse, talvez soasse um alarme igual à campainha, como essa que ela ouvia no momento. Mas não estava pisando em lista nenhuma! Então de onde vinha esse som de campainha? Como é irritante! Alguém pare com esse som, gritou sem ouvir a voz. Nisso pisou em falso na borda da lista, perdeu o equilíbrio e caiu jogando tigela e pipoca ao chão. Era a campainha da porta soando estridente. Malu rapidamente levantou-se e correu abrir a porta.
- Boa tarde. – disse ele com reserva.
- Boa tarde. – respondeu surpresa.
Podia imaginar quem fosse, mas nunca ele. O que ele queria?
- Desculpe aparecer assim sem telefonar...
- Sim! Mas o que houve? Deixei tudo certo, não deixei? Paguei até a primeira prestação.
- Sim, eu sei. Posso entrar?
- Ah! Claro, entre. Desculpe a bagunça.
- Bom, é que...
- Sente, faz favor.
- Obrigado. É que você me impressionou tremendamente que fui contra as normas da empresa.
- Que normas você está falando?
- Bem, você saiu da loja logo depois da compra, não pude falar com você.
- E daí? – disse quase que rispidamente, o que não era o seu intuito.
- Posso ser sincero?
- Claro.
- Quando você abriu aquela porta, percebi que estava interessado em mim.
- Convencido.
- Não sou, mas não sei porque percebi isso. Também fiquei interessado em você, principalmente depois que você abriu aquela porta. Sabe que depois que você fechou a porta, fiquei mais de cinco minutos te observando?
- Fiquei decepcionada pensando que não estava interessado em mim.
- Engano seu. Tanto é que pratiquei um crime contra as regras da loja.
- Que crime foi esse?
- Como gerente, isto é, auxiliar de gerência, tenho acesso aos arquivos dos clientes, e no seu fichário peguei o seu endereço.
- E com isso você corre perigo de ser demitido?
- Sim, mas vale o risco.
- Aceita algo para beber? – perguntou ficando em pé.
- Sim, quero, mas dos seus lábios. – respondeu ficando em pé também colando ao corpo dela.
Logo em seguida sem perceberem, seus lábios se uniram num longo erótico beijo.

03.07.07
pastorelli

domingo, 17 de janeiro de 2010

73 – A Dama do Metrô.



A luz do sábado refletia no calçamento da grande avenida. Tomada à decisão, tinha a certeza de estar fazendo o certo. O salto fino do sapato ecoava entre o barulho da manhã expressada por sua existência feminina. Não precisou andar muito. Viu seu reflexo da estatura media, mirrada na vitrine, quase completando vinte anos, o vestido que lhe cairia bem. Entrou na loja, não era uma Tifafny´s, mas possuía charme e elegância não ficando a desejar a nenhuma loja de roupas femininas.
Relanceou os olhos pelo ambiente assim que seus pés transpuseram a porta giratória.
- Pois não, senhorita? – perguntou o vendedor.
Malu o olhou de cima em baixo. Rapaz magro, meio espigado, de terno azul marinho, rosto quase oval, nariz aquilino, lábios vermelhos, Olhos profundos realçando a cavidade e as sobrancelhas grossas, dando-lhe um ar de prepotência superior.
- Será que passa batom? – perguntou mentalmente. – Saberei só beijando-o.
- O que a senhorita deseja?
- Ah! O que? Ah! Desculpe, estava distraída.
- Pois não senhorita.
- Quero ver um daqueles vestidos que está na vitrine.
- Um momento, vou chamar umas das atendentes.
- Pensei que fosse você...
- Não senhorita, temos moças especializadas em atender.
- Que pena! – Malu não conseguiu disfarça a decepção.
O rapaz sorriu levemente admirando-a no conjunto todo.
- Desculpe, sou apenas o gerente. Com licença.
Não demorou dois segundos, veio uma moça sorridente atendê-la.
- Pois não, senhorita?
- Por favor, quero ver aquele vestido da vitrine. – disse olhando para onde o rapaz sumira.
Enquanto esperava a atendente pegar o vestido, Malu numa ousadia, foi até a porta onde o rapaz entrou. Abriu de mansinho. O rapaz estava falando com outra moça, talvez atendente também. Num relance foi pega em flagrante.
- Desculpe, senhorita, essa área é proibida aos clientes.
- Está certo, desculpe, não deveria abrir a porta.
Rapidamente fechou a porta e foi sentar-se numa das cadeiras esperando a atendente que fora buscar o vestido.
O rapaz antes de fechar totalmente a porta, ficou por momentos admirando como se fosse uma Audrey Hepburn atraente que mexeu com seus instintos viris.
Malu disse para si mesmo.
- Que saco! Hoje vou ter que me consolar solitariamente comigo mesmo, é?
Entrando no apartamento, jogou as compras no sofá, tirou a roupa, e se dirigiu ao banheiro. Abriu o chuveiro, deixou que a água ferisse sua pele em fogo. Lentamente levou a mão entre as coxas e se deixou escorregar numa fantasia no qual o rapaz fazia parte.


02.07.07
pastorelli

sábado, 9 de janeiro de 2010

72 – A Dama do Metrô.




Colocou um sinal gráfico no texto e recostou-se na cadeira. Acendeu um cigarro. Foi até a cozinha, tomou um longo copo de água. Voltou para sala. Ligou o aparelho de som e colocou um cd. Ouviu o piano numa sonoridade melancólica como se perfurasse a carne, onde o sangue escorria palavras que aos poucos formava suas memórias. O tempo ingrato lhe dizia que já não é a mesma, que os seios, outrora fartos, pesa feito pedra; que a barriga sensual de penugem ralo excitante avolumou-se gradativamente; que as pernas antes roliças e lisas tornaram-se grossas mostrando pequenos vasos de veias; que seus lábios carnudos, sensuais, não trazem mais excitamento erótico ao dizer palavras libidinosas; que seus olhos antes vivazes estão meios opacos, lerdos em perceber as intenções; mas ainda tinha atração, se achava sensual.
- Ainda há rapazes que curtem uma coroa enxuta. – disse se exibindo ao espelho.
Com uma alfinetada de pesar constatou que não poderia escolher como antigamente escolhia suas presas. Agora aquele que caísse na sua armadilha, não importasse qual fosse, teria que traçá-la. Voltou ao computador. Voltou as suas memórias que no momento era o único prazer que poderia usufruir.
Nos primeiros meses Malu pensou somente no serviço. Trabalhava com uma prazerosa disposição aprendendo tudo que lhe ensinavam. Sabia ter potencial limitado, mas com o tempo essa limitação seria eliminada. Ao passar os meses de experiência é que Malu suspirou mais aliviada, no entanto tinha noção que ainda não estava segura, de uma hora para outra poderia ser demitida. Para que isso não acontecesse foi assimilando todos os aspectos, desde ao baixo nível até ao mais alto. Isto é, não chegou a aprender todos os pormenores do que, em matéria de serviço, ocorria na seção ao qual estava designada, mas tinha potencial para discutir quais fossem o assunto pertinente que surgisse no dia a dia.
Traçou um objetivo e dentro desse objetivo se empenhou ferrenhamente a conquistá-lo, mesmo que precisasse usar do seu charme feminino. Pouco importava com o que dissessem da sua atitude, tinha e precisava alcançar o limite máximo a que se propusera atingir.
Assim sendo ao receber seu primeiro salário como efetivada, gastou em roupas e sapatos e bolsas e perfumes, deixando apenas uma pequena quantia para seu lazer e condução.
27.06.07
pastorelli