sexta-feira, 29 de agosto de 2008

História em Projeto é finalista do prêmio Jabuti, 2008

Queridos amigos,

Como vários de vocês sabem eu recebi de presente uma segunda chance na vida, consegui sobreviver ao acidente anestésico e estou me recuperando dia a dia.

Hoje, no meu aniversário, recebi mais um presente: pela segunda vez, com a minha segunda obra didática (desta vez em co-autoria) estou na lista dos finalistas do prêmio Jabuti.



Na primeira vez, em 2005, fui agraciada com o terceiro lugar com a obra Paratodos- História.

Em 2005, antes de saber o resultado da segunda fase comemorei com muitos de vocês, pois estar entre os dez primeiros colocados já é um grande feito.

De novo a concorrência na categoria dos didáticos-paradidáticos é grande, tomara que a História em Projetos fique, como a Paratodos em 2005, entre os três primeiros, seria muito bom, conto com a torcida de vocês.

Gostaria também dividir essa alegria com minha co-autora Carla Miucci e toda a equipe da Ática sob a batuta do João Guizzo e do Aurélio Gonçalves (Aurélio sare logo para subirmos de novo no palco, 'é nóis na fita, mano' :)

Um grande abraço a todos vocês, velhos e novos amigos com quem posso dividir este presente.

Conceição Oliveira


ANIVERSÁRIO

Cada bardo n’algum tempo da vida

fez um auto-retrato.

Desconfio que foi no aniversário.

Um escreveu que a mãe determinou:

"Vai ser gauche na vida!"

Outro imputou sua sina

a um querubim chato,

que o predestinou a ser errado

para todo o sempre.

Eu não tive grandes manifestações:

nem de anjo, nem de bênção materna.

A primeira palavra que ouvi na vida

foi um sonoro: MERDA!

O fato se deu

pela falta de ultra-som!

Se a gestante tivesse tecnologia,

quem sabe não se frustaria

ao conceber uma fêmea

carregada de gonadotrofina...

Mas não tinha!

Daí a sina de tal menina....

Nasci ouvindo: MERDA!

Resolvi, transformar a dita

Num cumprimento: MERDA!

Como fazem atores, (franceses ou não),

desejando sorte e euforia

para os companheiros em estado

de dionisíaca encenação.

Minha vida prosseguiu

Fiz amigos, inimigos, não perdi a meta.

Quando feliz, quando triste,

sempre dizia: MERDA!

com dedo em riste, pra marcar opinião.

Hoje o dia passou,

Eu, arrumando as gavetas, uma a uma:

agreguei um segredo,

botei no cantinho o medo,

dobrei amarguras

e pendurei no cabide

toda a tristeza acumulada.

Sacudi a poeira da dor recente,

tirei os vincos daquela mágoa antiga,

pus ao sol meu sorriso pra quarar.

Joguei fora o excesso de ressentimentos

até os mais básicos,

aqueles que nunca saem da moda....

Talvez sirvam para alguém se agasalhar...

Chego a sentir um certo orgulho

da minha arrumação, embora tenha deixado

algumas peças desnecessárias no armário.

Tomando espaço, restou: o cheiro do amado,

a roupinha primeira da filha

e aquela alegria velha, com alguns furos

tão confortável pra dormir...

Dia findo.

Entretanto resta tanto a fazer...

a pia pinga, a progenitora liga

e não lembra do aniversário...

Eu não sei o que aconteceu de fato,

Mas não digo nada.

Mães têm o direito de esquecer.

Decido abandonar os pratos

(aqueles que denunciam a falta de paladar

e o tempo corroendo aquilo que era para alimentar).

Esqueço da maldita lâmpada

que teima em queimar na escada.

Quero ficar largada, receber o abraço dos amigos,

do amor, de mim.

No meu aniversário avaliei avanços e quedas.

Um pouco da herança que me resta:

não disse e nem ouvi: MERDA!

terça-feira, 26 de agosto de 2008

33 – A Dama do Metrô.


Desanimar não desanimaria, claro que não. Em último caso, marcaria uma consulta com o Dr. Valdo e quem sabe. Pipocaram fantasias na mente alucinada. Como sempre fazia, Malu saiu de casa preparada, mas não contava com a chuva e nem com o atraso do metrô. Um pouco antes de descer na plataforma, notara o movimento da caterva desvairada com medo de perder a hora. Por que a pressa? Será que não percebem que correr não resolve nada? Apenas aumenta a irritação, tanto sua como a dos outros. O povaréu não tem consciência da vida que levam. Pensam que vão perder o último metrô. O intervalo entre os trens é de três em três minutos, isso se nada ocorrer de anormal.
Malu observava aquela agitação sem se preocupar. Por isso, saia de casa mais cedo. Para que se enervar com a condução? Apesar de que para ela não tinha necessidade em chegar na hora certa. E também não queria ser exemplo para ninguém. Que cada um tenha na mente a responsável capacidade de fazerem o que lhe é de direito fazer e, agüentar as conseqüências. Que cada um andasse com suas próprias pernas o seu caminho. Malu nunca tivera uma orientação firme que a levasse a desviar de caminhos perigosos. Gostava de sentir o perigo da audácia na pele.
30.11.06
pastorelli

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

eu por mim
© mauricio rosa

não sou mais que essa dúvida ambulante
que se desconhece e à dor se entrega
um verso sem rima querer que se verga
ante a palidez da cruz, triunfante!
cego sou, pedinte, mendigo estelar,
da poeira parido e se integrando ao pó
perco a vida enquanto arrochando o nó
da existência abrigo a amplidão do mar.
não sou mais que essa imagem sem rosto
que me observa do espelho sem ver
razão no que digo prazer no que deixo
sob o véu da noite à foz escorrer...
escravo do tempo aos moucos me queixo
se no que abomino a sós me vejo posto!

quarta-feira, 13 de agosto de 2008

32- A Dama do Metrô


Não tinha meios de rever o loiro. Pensou onde e quando cruzara com ele. Duas vezes fora no metrô, e a outra vez fora ao procurar o psiquiatra, Dr. Valdo Pastore. Isso mesmo, o porteiro até lhe disse que o loiro era filho do psiquiatra. Ah! precisava marcar uma consulta com o médico.
Claro que precisava.
Enquanto isso, rebobinou a fita mental e chegou à conclusão da hora, não exata, mas um cálculo aproximado das vezes que cruzara com o loiro no metrô. Qual o nome dele mesmo? Não conseguia lembrar. Ah! já sei, berrou contente. Luciano... Luciano, repetiu várias vezes para não esquecer mais. Assim decidido, assim feito. A partir do dia seguinte, começou a pegar o metrô todos os dias no mesmo horário. Porém, estando na plataforma uma dúvida sombreou sua audácia. Qual carro? É qual carro fora? O primeiro, o segundo, o terceiro ou o último. Mais uma vez retrocedeu a fita mental e chegou à conclusão: fora no terceiro carro. Assim decidido, assim feito.
Já fazia quase três semanas que vinha pegando o metrô, no terceiro carro, e nada de encontrar com Luciano. Será que não pega mais metrô? Filho de médico deve ter seu carrão, vai trabalhar de carro, isso é, se trabalha também. Será que é médico como o pai? Poderia também estar de férias, viajou, ou sei lá o que. Quando fora a última vez que o vira? Há um mês, talvez menos até.
Seu instinto feminino lhe dizia para não desanimar.
28.11.06
pastorelli

ofício



o poema surge aos

poucos enquanto o

corpo confronta os

dias enquanto as


noites escurecem


aos encontrões rasgado na

pele na medida nunca

exata das

palavras enquanto a


vida procura por si

própria


o poema fecunda

diariamente a recusa

insípida

da morte



Adair Carvalhais Júnior

silêncio


poucas luzes pequenas

palavras sons quase

inaudíveis


uma chuva fina na janela


pernas trespassadas por

pernas o ardido do vinho bocas

desgovernadas


vertigens de prazer descerradas dos olhos


corpo dentro de corpo línguas

avermelhadas soltas

pela casa


as paredes desfazendo se nas mãos



noite vagarosa cobrindo a janela


pequenas luzes poucas

palavras




Adair Carvalhais Júnior

biografia XXXI - esperança



agora já são grandes Pedro e

Alice e morreram as duas

árvores que

plantei


perderam se no

mundo os poucos

poemas que

escrevi esvaziaram


se de mistérios as

noites

de

solidão


o corpo ocupa se cada

vez mais das marcas

do tempo a chuva já não

incomoda procuro no



inferno das

ruas um

enorme

silêncio


sonhos perscrutam a

morte fraquejam logo

de manhã dói olhar para


frente



Adair Carvalhais Júnior

sexta-feira, 8 de agosto de 2008

Réquiem

© mauricio rosa

Não me digam que o tempo derramou

Razão nas mazelas dos dias perdidos;

Sei, pela janela do meu desatino,

Que a vida, acossada, desacorçoou!

Apenas sementes dormentes ficaram

E sob mãos vadias entregues perecem...

O sol já não brilha e a lua abortou

O feto perfeito que traria ao mundo!

Não me digam que os olhos voltarão

A enxergar fartura neste campo insípido!

As rosas murcharam, presas na janela,

À espera da rega que alguém negou.

Eu não tenho pressa porque não adianta

Fustigar o passo sem ter onde ir...

Dó não tenho ou dúvida, ilusão ou fé,

Nada existe ao lado que valha guardar.

Partirei sozinho como um dia vim

Sem gestos, querências, pavores, sem voz...

Louco e incauto fui e sem me aperceber

Encalhei os sonhos no areal sem fim!

quinta-feira, 7 de agosto de 2008

paisagem
© mauricio rosa

ali onde descansa a velha estrada
de angústias carcomida, perfilada
como se ainda o reino hospedasse
e toda essência eterna fosse nada
viveu naqueles tempos um menino
que asas dava ao sonho peregrino
de desvendar segredos ver a fonte
donde vazava o sol e deus morava.
chamavam-no poeta e o silêncio
ao som de sua lira e sob a espada
da sua sapiência aquietava
recordo quando avisto a paisagem:
ali onde descansa a velha estrada
a exatidão dos homens pernoitava!

quarta-feira, 6 de agosto de 2008

Nós


Já não há nada a dizer.

Estranhamente os motivos
perderam o sentido,
fragmentados em migalhas
espalhados pelo tempo.

Asta Vonzodas

terça-feira, 5 de agosto de 2008

sem título
© mauricio rosa

seremos tão eternos quanto sós
e dentro do que formos, vagos, nus,
os nossos sentimentos sorverão
o peso que permeia nossa cruz!
diz, quanto sofrimento cuspirá
o mundo nos nossos olhos azuis?
centenas de milhares talvez mais
- o céu da eternidade nos dirá! –
e nada mais senão um verso frio
o nosso epitáfio guardará:
passamos, como o raio o sonho e o rio
depressa, de repente, rumo ao mar...
alguns aplaudirão, outros com frio
as dores tentarão agasalhar.

sábado, 2 de agosto de 2008

31 – A Dama do Metrô


Aureliano saiu batendo a porta. Malu não deu importância, já estava cansada dele. Estavam juntos mais de dois anos. Aureliano tornava-se chato, um porre na concepção dela. Dizia-se apaixonado, queria casar, se separar da mulher, divorciar e outros carvalhos a quatro. Malu não aceitava. Além do que, Aureliano não tinha a abrangência que ela tinha de ir além, e como todo burguês, Aureliano volta e meia caia no mamãe e papai. Para Malu isso era a decadência. Ansiava mudanças, coisa que ele não via com bons olhos. Toda vez em que propunha um jogo diferente, mesmo envolvendo apetrechos sexuais, era por ele rechaçado.

Aureliano chegou a ameaçar suicídio. Não acreditava que fosse capaz de tal ousadia. Molenga como era, até covarde, medroso, não declarava mas tinha pavor das conseqüências. Malu rezava para que voltasse para a esposa. Malu enxergava através do olhar concupiscente toda a ilusão que se dizia amor por ela.

Na verdade, Aureliano amava a esposa, os filhos, a vidinha melodramática burguesa em que fora criado. Não queria destruir o mundo que ele não conseguia ver. Aureliano não entendia por mais que ela tentava lhe explicar. Deveria descobrir por ele mesmo. Por isso, decidiu que aquela seria à última vez que se encontravam.

Cansada, alongou o corpo sinuoso e nu por entre os lençóis propondo a sim mesma não cair mais na lábia desonesta dos homens. Aureliano fora o primeiro e o último. Não renegava os momentos que passara com ele, mas nunca... Isto é, não é aconselhável dizer nunca faço isso ou aquilo, pois sabia por experiência própria que acabaria fazendo, mas tentava ou dizendo melhor, não se deixaria novamente ser levada pelo aspecto físico sem antes, conhecer o interior dos homens.

Nisso a imagem do loiro tomou conta da sua visão. Por onde andará ele, perguntou ao abrir o chuveiro. A água gostosa, morna, lanhou sua carne numa suave e excitante massagem reconfortando-a por completo. Terminado o banho, se vestiu, fechou o apartamento, desceu o elevador, passou pela recepção, deixou a chave com o recepcionista e ganhou a rua ensolarada pensando como fisgaria o loiro.

27.11.06
pastorelli